Pesquisadores brasileiros, em um esforço pioneiro, detectaram a presença da bactéria Leptospira sp., causadora da leptospirose, em mamíferos marinhos na costa do Brasil. Este achado é de significativa importância, considerando que a leptospirose é uma doença zoonótica que, nos últimos dez anos, resultou em mais de 2,8 mil mortes humanas no país. O estudo, conduzido por cientistas de diversos centros de pesquisa brasileiros, foi iniciado em 2020 e teve seus resultados recentemente publicados pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
O foco das pesquisas foi o DNA dos rins de mamíferos marinhos encontrados mortos. No total, 142 golfinhos de cinco diferentes espécies foram examinados, com a presença da bactéria sendo confirmada em 21 indivíduos. As espécies afetadas incluem Stenella clymene, Sotalia guianensis, Pontoporia blainvillei, Steno bredanensis e Tursiops truncatus. Foi observado que a prevalência da bactéria é mais alta nas espécies costeiras (25%, ou 17 de 68 indivíduos) em comparação com as oceânicas (7,5%, ou quatro de 53 indivíduos). O boto-cinza (Sotalia guianensis), comum na Baía de Guanabara, Rio de Janeiro, mostrou a maior taxa de infecção, com 47,6% (dez de 21 indivíduos) testando positivo para a bactéria.
Interessante notar, entre os golfinhos-do-Rio-da-Prata (Pontoporia blainvillei), encontrados entre a Argentina e o Sudeste do Brasil, a prevalência atingiu 33,4%. Este estudo marca a primeira vez que a Leptospira sp. foi detectada em duas espécies costeiras – o boto-cinza e o golfinho-do-Rio-da-Prata – e também no golfinho-Clímene (Stenella clymene), uma espécie oceânica.
Além dos golfinhos, 47 lobos-marinhos das espécies Arctocephalus australis e A. tropicalis foram examinados, com 15 deles apresentando a bactéria. Curiosamente, o patógeno foi encontrado com mais frequência em indivíduos que habitam áreas de maior concentração humana.
A origem da contaminação ainda é incerta, necessitando de mais investigações. Há suspeitas de que os animais sejam infectados por efluentes contaminados com urina de rato em áreas litorâneas próximas a grandes cidades e portos, além de locais com saneamento básico deficiente.
Nos Estados Unidos, estudos com leões-marinhos revelaram que a leptospirose pode causar inflamação aguda nos rins dos animais, levando a sintomas como dores, desidratação, magreza e até morte. No Brasil, ainda não foram encontradas evidências de lesões renais nos animais estudados, conforme informa Felipe Torres, pesquisador da Universidade Federal Fluminense. No entanto, é necessário avaliar outros parâmetros para confirmar se há manifestação clínica da doença nos mamíferos marinhos do país.
Este estudo ressalta a importância de continuar a pesquisa para entender melhor o impacto da Leptospira sp. nos mamíferos marinhos brasileiros e suas implicações para a saúde pública e animal.
Peter Prestes