Problemas complexos. Soluções simples?

    0
    PELÁGIO CANAVARROS

    É cada dia mais frequente observarmos alguns posicionamentos inusitados em relação às possíveis soluções para alguns dos problemas complexos que acometem o nosso País. E tal fenômeno não está circunscrito às rodas de bate-papo ou redes sociais, afinal já não nos surpreendemos mais ao depararmos  com a sua expressão mediante os atos e/ou omissão por parte dos membros das nossas mais diversas instituições.

     

    Partindo da premissa de que toda e qualquer discussão nos faz refletir e aprender com a diversidade de pensamentos e opiniões, acredito ser pertinente trazer a estas argumentações a máxima de H. L. Mencken, notável jornalista e crítico social norte-americano que, no final do século XIX, dizia: “para todo problema complexo, existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada”.

     

    Parece ter surgido uma espécie de fenômeno muito frequente no nosso meio político e social, a adoção de soluções cada vez mais simples para problemas cada vez mais complexos.

     

    Ao que tudo indica, Mencken não só foi um grande observador em seu tempo, mas também um visionário. Vejamos por quê.

     

    Quando se aborda, por exemplo, sobre a complexa situação envolvendo a violência no Brasil, ouvimos em alto e bom tom, a solução – “Armem a população” –, como resposta simples ao problema.

     

    Seria como se, num passe de mágica, enfim, tivéssemos o tão sonhado antídoto para esse problema que nos acomete há décadas. Simples assim… Não, não é tão simples, em que pese a necessidade de se obedecer aos requisitos da lei para se ter uma arma registrada ou mesmo portá-la à rua.

     

    Ato contínuo, e no mesmo sentido, quando o tema versa sobre o papel do Estado e sua interferência na vida econômica das pessoas, nos chega aos ouvidos a solução dita simples, mediante estas breves palavras: “o Estado deve ser mínimo, e não-assistencialista”.

     

    E quando é posta esta solução, surge por parte de alguns a indignação com a ajuda financeira aos necessitados, até mesmo nestes tempos de pandemia. Oras, que seja mínimo, mas qual o problema de o Estado, tendo recursos para tanto, alcançar os mais pobres, dando-lhes o peixe por um tempo, enquanto os capacita a serem pescadores de seus próprios sonhos, podendo enfim caminharem com seus próprios pés?

     

    Como se vê, as situações em si são complexas e nelas encontramos vertentes que precisam ser dissecadas e analisadas, para  então serem trazidas as soluções a cada um de seus aspectos, alcançando o todo que a traduz.

     

    O mesmo tom se percebe em uma das áreas mais significativas para a vida humana, porquanto nela se expressou significativo avanço mediante a compreensão dos direitos fundamentais do ser humano. Qual seja, os Direitos Humanos. Não raro se ouve a indigesta frase “direitos humanos para somente os humanos direitos”, ou seja, aos cumpridores da lei a extensão de todo o respeito. Aos que vivem à margem da lei, o descaso e a submissão a condições degradantes.

     

    O sistema prisional traduz essa atitude há décadas, na maioria dos casos, verdadeiras “masmorras medievais”. Soa como se uma subclassificação da espécie humana surgisse. A eles, sim, o rigor da lei, contudo, jamais a submissão a situações degradantes. No mínimo, questiono: a ressocialização do apenado não é algo que se espera após o cumprimento da pena? Como se pode alcançar tal resultado se o mantivermos por anos, sujeito a situações desumanas?

     

    Com a Educação não poderia ser diferente, afinal é muito comum surgir uma espécie de resposta, que de tão simplista, costumo chamá-la de “terceirização de culpa”, pela qual se procura atribuir a uma única pessoa, todas as responsabilidades pelas falhas educacionais que atravessaram gerações, e por diversos motivos. Eis o nome do “culpado”: Paulo Freire.

     

    Não se trata de uma defesa em favor do renomado educador, mas me pergunto se não esteja ele se tornando uma espécie de sombra que esconde as inúmeras irresponsabilidades de nossos governantes que não se preocuparam e continuam a não se preocupar verdadeiramente com o tema, parecendo desejar que melhor continuasse o povo na ignorância.

     

    Diante destas observações, portanto, cada dia mais procuro refletir a partir da lição que se depreende da máxima descrita por Mencken, onde para problemas complexos, requer-se, sobretudo, soluções complexas. No entanto, caso fosse inevitável uma resposta simples para quaisquer destes problemas complexos apresentados, ousaria resumi-la em uma única palavra, contudo advertindo que apenas a sua aparência seja simples, pois que de sua essência brota tanto a simplicidade quanto a complexidade. E esta resposta é a Educação.

     

    Neste sentido, convém ressaltar, já que falamos de educação e mencionamos o nome do educador Paulo Freire, a sua frase que afirma: “a educação não transforma o mundo. A educação muda pessoas. As pessoas transformam o mundo”.

     

    Rendo, por fim, minhas homenagens à memória de Mencken, tanto por sua observação em seu tempo, como pelos ares de visionário enquanto lido em nossos dias.

     

    De fato, a seriedade com a qual devemos lidar com os problemas complexos não se constitui por soluções tão simples. Afinal é preciso pensar na extensão das consequências. Seja, portanto, tal reconhecimento de respostas mais complexas às questões igualmente complexas, a resposta simples aos que por ela clamam.

     

    Pelágio Canavarros é advogado.

    DEIXE UMA RESPOSTA

    Por favor digite seu comentário!
    Por favor, digite seu nome aqui